Estudo da Accenture aponta avanços e desafios para a construção da cultura inclusiva
Por Thaís Aiello, 21.09.18
Beatriz Sairafi, da Accenture: igualdade e inserção LGBT permanecem um desafio
Com quase 450 mil profissionais no mundo e presente em mais de 120 países, a Accenture tem na diversidade um aspecto crítico de sua própria existência. Saber viver, respeitar e acolher as diferenças está no cerne da organização, que tem se debruçado sobre o tema. Se em 2017 a tônica foi a questão feminina, neste ano a contribuição para refletir acerca da importância da diversidade e da cultura da igualdade recaiu sobre as perspectivas do mercado de trabalho para o público LGBT. O estudo Getting to Equal 2018 LGBT ouviu, em 31 países, cerca de 1.500 profissionais desse segmento da sociedade, em um levantamento que envolveu empresas de diferentes segmentos. Para comentar o resultado da pesquisa, o Panorama Executivo entrevistou Beatriz Sairafi, diretora de recursos humanos da Accenture para o Brasil.
Panorama Executivo – O que inspirou a Accenture a realizar o Getting to Equal 2018 LGBT?
Beatriz Sairafi – A agenda da diversidade é estratégica para a Accenture, uma vez que a empresa se insere em um contexto plural, tanto por reunir em suas fileiras mais de 400 mil pessoas no mundo, com presença em diferentes países, quanto por atender a clientes de diversos segmentos e com realidades distintas, o que exige soluções criativas, ambiciosas e fora da caixa. Nessa perspectiva, estamos empenhados em entender o impacto da cultura de igualdade e inclusão no ambiente de trabalho. Em 2017, nosso primeiro estudo buscou identificar como o mundo digital tem influenciado a carreira das mulheres. Agora, lançamos um olhar para o a inserção LGBT no mercado de trabalho, de modo a compreender quais os fatores que influenciam as organizações no que se refere à promoção da equidade, da igualdade e do engajamento.
Panorama Executivo – Quais foram as principais constatações da pesquisa?
Beatriz Sairafi – O estudo traz evidências inequívocas de que a inclusão propicia maior engajamento e, por conseguinte, mais resultados. Em empresas comprometidas com a diversidade e que investem em uma cultura voltada à equidade, o nível de satisfação dos funcionários com a progressão da trajetória chega a ser três vezes maior do que em organizações que não se debruçam sobre essas questões. Isso porque, nos ambientes inclusivos, os profissionais reportam chances 50% maiores de avançar para posições gerenciais e três vezes mais oportunidades de alcançar posições seniores executivas. Sem necessidade de dissimulações e sendo elas mesmas, as pessoas encontram espaço para, dentro do seu perfil, progredir na carreira.
Panorama Executivo – E quais os principais desafios para a construção da cultura de igualdade?
Beatriz Sairafi – Foram estudados 40 fatores que contribuem para a construção desse tipo de cultura. Um dos mais críticos se refere à postura das lideranças. Não basta um patrocínio verbal; ele tem de ser evidenciado na prática, em ações concretas. Antes de mais nada, é preciso que as empresas tratem o tema de forma aberta, admitindo que a pauta tem pertinência justamente porque a equidade ainda não existe. Há, portanto, necessidade de ampliar o debate e estabelecer objetivos e metas de melhoria. Um aspecto promissor do estudo é o fato de 92% dos entrevistados reportar que acreditam que suas organizações tenham feito grandes progressos rumo à cultura de igualdade.
Panorama Executivo – Quais os indícios apontados para justificar essa percepção?
Beatriz Sairafi – O estabelecimento de metas públicas de diversidade e a adoção de ações capazes de garantir que as pessoas possam ser elas mesmas são apontados como fatores-chave dessa evolução. A igualdade se alicerça na cultura de abertura, na qual as pessoas não têm de abrir mão de seu estilo, de seu jeito de se vestir ou arrumar o cabelo, nem precisam esconder a tatuagem ou modificar a aparência para se enquadrar ao ambiente e ser aceita. Quando não existe essa abertura, o nível de engajamento e a permanência na organização sofrem grande impacto. Como criar, inovar e dar o seu melhor se você não pode ser autêntico?
Panorama Executivo – Sabemos, no entanto, que essa abertura ainda é algo a ser conquistado em muitas organizações, não?
Beatriz Sairafi – Sim, e o estudo apontou também que, quando não há abertura nem objetivos claros de igualdade, dobram as chances de ocorrer descriminação e abuso, seja ele moral, ético ou sexual. Entre os entrevistados, 54% dizem ter sido convidados a mudar a aparência e o jeito de ser – ou relatam conhecer quem tenha passado por isso. Esses são pontos críticos e que exercem forte impacto no que se refere ao engajamento dos profissionais.
“Enquanto sociedade, ainda temos muito a evoluir no Brasil, especialmente quanto à inserção do público LGBT”
Panorama Executivo – Que outros aspectos do estudo você considera relevantes?
Beatriz Sairafi – Um deles é a flexibilidade, considerada como driver importante para a construção de um ambiente mais inclusivo. Essa prática pressupõe que há formas diferentes de atuação, ou seja, que nem todos trabalham – ou precisam trabalhar – de uma maneira única e uniforme. Horários flexíveis, possibilidade de atuar remota e virtualmente, tudo isso contribui para a humanização do trabalho e o respeito ao indivíduo. Um segundo aspecto relevante apontado pelo estudo diz respeito às empresas que investem em treinamento e desenvolvimento de skills, tendo em vista preparar suas pessoas para um mundo novo, mais inclusivo. São aspectos que aumentam a probabilidade de alcançar índices de engajamento maiores.
Panorama Executivo – Em termos de Brasil, como a cultura de igualdade tem sido tratada no ambiente corporativo?
Beatriz Sairafi – Enquanto sociedade, ainda há muito para evoluir no Brasil, especialmente no que se refere ao público LGBT. No contexto das empresas, as multinacionais presentes no país estão mais avançadas nessa agenda. Na Accenture, por exemplo, dispomos de iniciativas robustas, a exemplo do comitê de ética e de canais de denúncia para qualquer tipo de assédio, discriminação ou preconceito. Temos trabalhado muito a questão do preconceito inconsciente, incentivando a atenção e o respeito ao outro. Mesmo na crise, mantivemos nossos investimentos nessas frentes, porque é esse o ambiente que perseguimos – aberto, inclusivo, diverso e equânimo.